Dia 3 de maio foi celebrado o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, data criada em 1993 pela Organização das Nações Unidas (ONU) para reafirmar o direito de livre expressão. Na Era Digital, esse direito é cada vez mais utilizado, pois a internet deu voz a todos e tornou a comunicação horizontal e democrática. Pelas redes sociais as pessoas expõem suas opiniões, divergem e discutem entre si e criam um fluxo de compartilhamento jamais visto.
Com o crescimento da informação de fácil acesso vieram também os problemas. O mais atual e preocupante são as “fake news”, ou em um termo mais correto, desinformação. São conteúdos falsos ou distorcidos, criados propositalmente para divulgação em massa com o objetivo de atingir o maior número de pessoas que possam dar veracidade à informação.
Veículos de imprensa e as gigantes de tecnologia vêm trabalhando em estratégias e ferramentas para lidar com a desinformação. Métodos de checagem profissional, orientações educacionais à sociedade e sistemas de filtragem na internet são alguns dos recursos já desenvolvidos para diminuir os impactos que uma informação falsa pode gerar.
A preocupação mundial com a desinformação é tão grande que análises de especialistas mostraram o impacto do fenômeno nos resultados das eleições americanas em 2016, que elegeram o atual presidente Donald Trump.
A possibilidade de impacto na política já causa desconforto também por aqui e tem incentivado a elaboração de Projetos de Lei relacionados ao tema. De 2018 até agora, 17 PLs que abordam o termo “fake news” foram propostos na Câmara dos Deputados. Grande parte busca caracterizar como crime a criação e divulgação de informação falsa, com punições que variam entre pagamento de multas e prisão.
É o caso do PL 200/2019 do Deputado Roberto Lucena (Podemos/SP). O texto prevê multa que pode chegar a R$ 4.000,00 e detenção de 2 a 8 meses para quem “divulgar ou compartilhar, por qualquer meio, na rede mundial de computadores, informação falsa ou prejudicialmente incompleta”.
O PL 241/2019 do Deputado Júnior Ferrari (PSD/PA) também defende a penalização e justifica que o Brasil “é terreno fértil para a disseminação de notícias inverídicas por meio eletrônico”, concluindo que a velocidade da comunicação e a impunidade estão presentes nesse meio de comunicação.
O PL 9647/2018 chama a atenção, pois propõe alterar o Marco Civil da Internet, vigente desde 2014. A proposta quer responsabilizar também as empresas pelos conteúdos divulgados por seus usuários, o que atualmente não acontece antes de uma ordem judicial. O deputado Heuler Cruvinel (PSD/GO) defende que “é necessário um controle legal do Estado sobre este tipo de ação nociva a qualquer sociedade e formação de opinião, livre de qualquer patrulhamento ideológico”.
17 Projetos de Lei foram propostos na Câmara dos Deputados em 2019 | Foto: Felipe Moura
Há também projetos focados na prevenção. É o caso do PL 1974/2019 do Deputado Reginaldo Lopes (PT/MG) que pede a criação da Semana Nacional de Enfrentamento a Fake News, para orientar a população sobre os riscos das notícias falsas. Já o PL 559/2019 do Deputado Paulo Pimenta (PT/RS) aposta na inclusão do tema no currículo escolar, garantindo às futuras gerações o preparo adequado para “essa ameaça potencial ao estado democrático de direito”.
Apesar dos danos causados pela desinformação, especialistas defendem que projetos como esses não são efetivos e criam brechas para a censura. Para Helena Martins, coordenadora executiva da Intervozes, organização que trabalha pela efetivação do direito à comunicação no Brasil, a maioria das iniciativas focam em saídas que não são efetivas e buscam apenas a punição, enquanto o problema maior, a indústria de criação de conteúdo falso que existe hoje, continua sem solução: “Muitos desses projetos acabam criminalizando o usuário e gerando uma postura que é a postura da intimidação, portanto você não vai compartilhar uma informação que você não teve como verificar… Na prática o que pode acontecer é uma autocensura”.
Helena defende a discussão de outros mecanismos para o combate à desinformação, como a transparência dos algoritmos das plataformas. Ela acredita que ao analisar o funcionamento dessas redes, é possível entender como acontece a propagação dos conteúdos. Outra abordagem efetiva, segundo ela, seria a educação para a mídia, com “políticas públicas que fomentem e fortaleça a criticidade das pessoas em relação aos conteúdos que elas recebem de forma geral”.
Especialistas defendem a educação para o tema e medidas que vão além da punição | Foto: Marten Bjork/Unsplash
Ela lembra que passos importantes já foram dados para combater a desinformação, mantendo direitos consagrados e que aprofundar neles seria a melhor solução. É o caso da Declaração sobre a Liberdade de Expressão e Notícias Falsas, Desinformação e Propaganda, assinada em 2017 pela ONU e por outros órgãos internacionais, além do Marco Civil da Internet que já garante a remoção de conteúdos falsos, desde que analisados e julgados: “O nosso desafio agora é efetivá-lo de uma maneira rápida, consistente e debatida publicamente. É uma questão judicial que deve envolver todo um debate público. Acho que essa é a forma mais democrática para lidar com esse problema”, finaliza.
Enquanto se discute os caminhos para a redução das notícias falsas, é importante que cada pessoa possa fazer sua própria verificação dos conteúdos que compartilha nas redes. A internet traz a abertura ilimitada à informação, seja ela verídica ou não, e é a busca pela transparência e senso crítico que podem definir o que será consumido pelo usuário.