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Em 23 de setembro, enquanto muitos cidadãos chegavam em casa após um longo dia de trabalho, em Havana, Cuba, acontecia algo de extrema importância para a paz da América Latina. Depois de três anos de negociações cheias de controversas e dificuldades, o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) chegaram ao mais importante acordo em matéria de justiça. A partir de agora, conforme restou acordado, eles terão um prazo máximo de seis meses para pôr fim ao conflito mais longo da região.
Tal fato, pode não significar muito para o Brasil, a final, é só mais um problema de um país irmão. Contudo, para os colombianos é um marco importante que resultará no fim de anos de violência e guerrilha.
Para melhor entendimento do caso, é importante trazer uma curta explicação do conflito colombiano, seus protagonistas e consequências:
Nos anos 50, os dois principais partidos políticos da época (Liberais e Conservadores), lutaram de um modo sangrento pelo poder da Colômbia. Aquele conflito chamou-se: La Violencia e gerou a aparição de diversos grupos criminosos que conseguiram ocupar os espaços deixados por um Estado em guerra.
Entre eles o mais importante e antigo: as FARC, organização guerrilheira de orientação marxista-leninista que existe na Colômbia desde 1964. Seus integrantes alcançam os 16.000 e são considerados o principal grupo criminoso do país.
Segundo um informe feito pela BBC no ano 2004: “as FARC se descrevem como um exército do povo considerando-se uma alternativa válida de poder popular. Porém, a opinião dos governos da Colômbia, dos Estados Unidos e da União Europeia, é bem diferente. Para eles as FARC são um grupo terrorista financiado pela extorsão, o sequestro e o tráfico de drogas. Durante quatro décadas as Farc têm sobrevivido a onze governos”
O atual conflito desenvolve-se desde princípios da década de 60. Tem sofrido a intervenção direta de agentes como o Estado colombiano, os grupos paramilitares de extrema direita, as guerrilhas de esquerda e o narcotráfico.
As causas gerais são diversas, disparidade na distribuição da terra para os camponeses, presença estadual deficiente e até as grandes brechas econômicas sociais. Por conseguinte, a população civil é a primeira que sofre as consequências do conflito.
“Os civis das regiões afetadas pelos enfrentamentos ainda estão expostos a atos de violência: homicídios, sequestros e recrutamento forçado. Muitas pessoas são obrigadas a fugir e a abandonar seus pertences e casa. O conflito também gera graves consequências para quem permanece, pois se encontra limitado o acesso aos serviços médicos” (Comitê Internacional da cruz Vermelha, 2010).
Contudo, para aqueles que moram nas zonas de conflito, as condições de vida são ainda mais graves, pois são transformados na bucha de canhão perfeita graças à guerrillha.
Além disso, há uma falta de distinção entre combatentes e civis que gera estigmatização pelos grupos armados (exército, extrema direita e guerrilha). A situação dos civis colombianos torna-se quase igual à situação dos civis sírios fugindo do Estado Islâmico. Com mais de 5.3 milhões deslocados internos pela violência, a Colômbia ocupa o segundo lugar nesta desonrosa lista, somente superada pela Síria que com 6,5 milhões de pessoas ostenta o primeiro lugar.
O conflito tem feito da Colômbia um país atípico no panorama mundial. Com um desenvolvimento humano médio, suas instituições ainda são fracas e o conflito longo demais. Até agora, o Estado tem sido incapaz de atenuar as diferenças entre as elites e os camponeses.
Quanto mais passam os anos, faz-se mais latente que a situação não tenha mudado realmente. Se olhasse um jornal de vinte, trinta ou quarenta anos atrás, o leitor encontraria em essência as mesmas notícias, as mesmas problemáticas e os mesmos agentes envolvidos.
Porém, o exemplo colombiano está longe de ser único. O Brasil e toda América Latina em geral representam sociedades desiguais onde a má distribuição da riqueza é um dos problemas mais recorrentes. Sociedades ricas compartilham espaços com pessoas que moram na miséria sem nenhum tipo de vergonha. Juntos, formam um ecossistema onde os ricos acostumaram-se a ver pessoas morrendo de fome nas ruas e os pobres acostumaram-se a assumir seu rol de atores secundários e oprimidos.
Existem pessoas valentes que investem seu tempo e recursos em mudar estas situações, porem as sociedades e os governos latino-americanos carecem da maturidade suficiente para aproveitar e incentivar estas ações. As pessoas que desde sua posição de conforto acham que uma sociedade mais igualitária é possível, são catalogadas como guerrilheiros comunistas. Ao mesmo tempo, a pessoa de classe baixa que decide mudar sua situação, vai encontrar uma sociedade desconfiada não muita disposta a estender a mão.
É um círculo vicioso que tem acontecido nos países da região. Na Colômbia por exemplo, o grupo político de esquerda: a ‘União Patriótica’ (a primeira tentativa das Farc para deixar as armas) foi exterminado pelos grupos de extrema direita. Cada integrante desta organização foi morto e os que conseguiram escapar, terminaram exilados na Europa. Ficaram sem a oportunidade de mostrar-lhe à Colômbia que o caminho da negociação era possível.
Agora que depois de muitos anos e excessos, as Farc encontram-se em um processo de negociação com o governo, grande parte da sociedade Colombiana ainda não confia nele. Somente pensam nos lideres ruins deste grupo, mas não nos guerrilheiros camponeses. Estes camponeses (noventa por cento das Farc) nunca tiveram outra oportunidade diferente do que pegar as armas. São produto de uma sociedade indiferente e de um governo incapaz de fazer presença para garantir os direitos mínimos da sua população.
Sem memória do passado, acha-se que são melhores outros 50 anos de guerra, se com isto um guerrilheiro comunista não vai ser congressista ou presidente.
Aqui o mais preocupante é a falta de memória histórica e de noção de tragédia. Não estamos olhando o nosso reflexo nos espelhos do passado. Muitos latino-americanos acostumaram-se a morar na tragédia.
A Colômbia não pode continuar repetindo a sua história, assinar um acordo de paz é o caminho a seguir. Além das críticas, este país sul-americano precisa dar um verdadeiro exemplo de reconciliação e se converter em um exemplo mundial como líder na resolução de conflitos.