Quem pratica snowboard sabe que apesar das manobras serem despojadas e radicais, o fundamental é a concentração e disciplina. Allana de Oliveira Barbosa Leite, tem 25 anos e nasceu em Barra Mansa, no Rio de Janeiro. É do tipo de atleta que leva a sério o esporte. Afinal, entende os riscos que precisa enfrentar para superar o medo e vencer os desafios das competições. Apesar de achar Jamie Anderson sua favorita na categoria de slopestyle, Allana tem como referencial a atleta Kelly Clark e por isso está se preparando para a próxima temporada que começa daqui há três meses.
TI – Allana, você é brasileira, mas mora nos Estados Unidos? Em que cidade vive e onde faz seu treinamento?
AL – Atualmente moro em Aspen, no Colorado. A maioria do meu treinamento é realizado aqui mesmo. Durante o inverno treino três vezes na semana com o AVSC (Aspen Valley Ski/Snowboard Club) na montanha e os outros dias coloco em pratica o que aprendi. No verão, como agora, faço treinos indoor e crossfit (treinamento funcional) com o acompanhamento do meu personal trainner.
TI – Quando você começou a praticar snowboard?
AL – Comecei a praticar na temporada de inverno de 2007/08, quando vim a primeira vez pra Aspen, fazer work experience com minha prima.
TI – Embora o Brasil seja um país tropical, já contamos com diversos atletas competindo em esportes de inverno como o snowboard. Para você, como é representar nosso país e fazer parte desse grupo?
AL – É um imenso prazer fazer parte deste grupo e estar representando o país. O esporte está crescendo cada vez mais e a família também. O mais legal é saber que as pessoas te admiram ainda mais quando sabem que você não começou desde pequenininha e vem de um país quem não tem neve (ainda não o suficiente pra andar de snow, mas quem sabe no futuro, no Sul, quem sabe? rs)
TI – Recentemente você venceu a etapa final do circuito regional de slopestyle (SS), nos Estados Unidos. Como é esta prova de SS e o que sentiu quando percebeu sua vitória?
AL -A prova é regional e tem participantes locais. Foi bastante incentivador e motivante vencer as etapas e principalmente divertido, pois todos os amigos do AVSC (Aspen Valley Ski & Snowboard Club) participam, então no final é uma grande festa.
TI – Você já venceu e participou de outras competições? Se você tivesse que relacionar principais conquistas, quais seriam?
AL – Participei do campeonato Brasileiro na categoria open de Slopestyle e de Bordercross ano passado em Valle Nevado – Chile e ganhei primeiro e segundo lugar, respectivamente. Acho que essas foram minhas principais conquistas, pois foi meu primeiro grande campeonato e eu estava com um pouco de medo do segundo pulo no treino. Os tamanhos e estilos de pulos variam entre os resorts e não é nada fácil chegar e pular algo que você nunca tentou, um dia antes da competição, mas consegui superar o medo.
TI – Depois da vitória em Vail ASpen, você foi chamada para competir no circuito nacional? Como é esta competição?
AL – O circuito acontece durante toda a temporada, começando geralmente em Dezembro e terminando em Março. As provas acontecem todos os fins de semana, em diferentes cidades em todo o Estado. Você precisa vencer a maioria (por exemplo, se participou de três provas precisa ter vencido dois, ou se participou de cinco, ter vencido pelo menos três), para ser convidada a participar do Nationals, que acontece em Vail e reúne os “vencedores” de cada categoria.
TI – Existe algum atleta da sua modalidade que você admira e tem como referencial?
AL – São muitos talentos, mas admiro a Kelly Clark em particular por ela ser uma vencedora, não só nas competições, mas na vida. Não canso de assistir (e me emocionar) o vídeo dela chamado “My Life”. No slopestyle a Jamie Anderson domina e é minha favorita.
TI – Você tem um preparador físico ou treinador? Como é a sua rotina de treinamento?
AL – Tenho três treinadores no inverno com o AVSC e comecei a fazer crossfit (treinamento funcional) quando estava no Brasil em abril e continuo fazendo “treino a distancia”. Meu preparador físico, Gustavo Pires, é de Cabo Frio, RJ e ele não da moleza, todo dia manda um treino novo. Estou fazendo treinamento de fortalecimento muscular e dieta pra entrar forte na próxima temporada. Ano passado tive que fazer cirurgia três meses antes da season começar e passei o inverno todo fraca, com dores no joelho e no corpo. A preparação que antecede a temporada é fundamental para o desenvolvimento.
TI – Faz alguma dieta? O que gosta de comer e qual a é sua alimentação durante os campeonatos de snowboard?
AL – A alimentação nos EUA é bem diferente, todo mundo sabe rsrs, mas procuro ficar longe das tentações daqui e mantenho uma alimentação equilibrada, troco o carboidrato normal pelo integral sempre que posso e tento não passar do meu limite de calorias diário. Já perdi 4kg desde que intensifiquei a dieta.
TI – Você continua estudando? Além do snowboard, você tem outra ocupação e pretensão profissional?
AL – Me formei em Relações Internacionais faz quase dois anos. Agora está batendo vontade de voltar a estudar, fazer um curso, pra me manter atualizada, mas ainda não encontrei algo perto que seja do meu interesse.
TI – O Governo dá algum subsídio para você evoluir no esporte ou recebe algum patrocínio?
AL – Infelizmente o governo não contribui ainda. Temos apoio da Associação Brasileira de Snowboard e também da Confederação Brasileira de Desportos de Neve.
TI – Como você enxerga os programas pedagógicos dos Estados Unidos e outros países que apoiam e incentivam os esportes de inverno?
AL – Acredito que o incentivo ao esporte seja muito importante, independentemente de ser um esporte de inverno ou de verão. O esporte te ensina a conviver em grupo, a ouvir e a prestar atenção e ajuda a criar metas e ter foco para cumpri-las, além de tirar muitas crianças das ruas. A gente vê crianças de todas as classes socais praticando algum tipo de esporte aqui nos Estados Unidos, independente se elas podem contar com um tênis apropriado ou equipamento de ponta. Se você é bom, será reconhecido. Não é a toa que os países com mais medalhas nas olimpíadas, são os que mais incentivam o esporte.
TI – Existe eventualmente algum preconceito contra brasileiros no esporte, por parte daqueles que já nasceram em países onde há muita neve?
AL – Não que eu tenha presenciado, pelo contrário, as pessoas ficam super animadas com a situação, e sempre perguntam: mas não tem neve lá? Como é isso? rs
TI – Você tem amigos de toda a parte. Quais países você esteve que mais gostou de competir? Vocês fazem muita festa? Como se divertem no frio?
AL – Só tive a oportunidade de competir nos EUA e no Chile, mas Valle Nevado foi super divertido, viajamos com pouco mais de 20 pessoas. Eu conhecia três deles somente, mas não tive problema nenhum, gosto de estar com pessoas novas, é sempre bom fazer novas amizades.
TI – Você tem tempo para namorar? Está solteira ou se relacionando com alguém no momento?
AL – Fazemos muita coisa juntos, conseguimos conciliar as rotinas quando os dois estão em Aspen. Já fui ao Brasil duas vezes sem ele e ao Chile uma e quando ficamos separados geralmente é por um período e uma distancia grande, mas nunca tivemos problemas.
TI – Tem saudades do Brasil? Como lida com esse sentimento?
AL – Tenho muita saudade da minha família e amigos e também da facilidade do Rio. Ter acesso a qualquer coisa a qualquer hora do dia faz um pouco de falta. Eu tenho ido ao Brasil bastante, em uma media de seis em seis meses o que ajuda.
TI – Se você voltasse para o Brasil, o que gostaria de fazer?
AL – Moraria no Rio de Janeiro, procuraria um trabalho na área de esportes, compraria um skate novo e com certeza uma prancha de surfe.
TI – Qual o seu passo seguinte? Sente-se preparada para a próxima bateria?
AL – Estou muito preparada, me sinto forte pra começar a temporada apesar de faltarem três meses ainda, vou continuar competindo por aqui, mas com o foco lá no Nationals.