“Um caro momento de prazer”
Acho que já falei aqui, mas estou de férias em Nova York. Essa noite meu pai e eu fomos a um restaurante bacana. A gente merece, né?
(Essa frase, a gente merece, é a ruína da classes média, mas beleza. Estamos de férias. A gente merece.)
O problema do restaurante bacana em Nova York é que você tem que pedir um vinho bacana. A garçonete, que usa terno e gravata e se veste que nem homem, chega com a carta de vinhos. Pelo tamanho e pela capa de couro, parece um manual de bruxaria da Hogwarts School.
“O senhor quer a ajuda do sommelier?”
“Claro, o sommelier seria ótimo”, respondo já com o arrependimento me assaltando no meio das frase. Assaltando é jeito de dizer.
“O senhor tem alguma coisa em mente?”
Quando um sommelier fizer esta pergunta num restaurante bacana, lembre-se dessa regra: NUNCA diga Borgonha. NUNCA diga Bordeaux. NUNCA diga Toscana. Esqueça tudo o que você ouviu do Renato Machado. Vai por mim.
“Quem sabe um pinot noir da Califórnia?” Hahaha, te peguei, sommelier. Vai ter que recomendar um vinhozinho nacional!
Não sei se foi por orgulho americano, mas não é que o cara deu três sugestões boas? Entre elas um tal Chapter 24, que não é da Califórnia mas do Oregon e também faz vinhos legais.
US$ 248 a garrafa. Quer saber?, dane-se o dinheiro. Qualquer coisa eu meto um consignado quando chegar a fatura do cartão.
Eu já ia devolvendo a carta quando vi que eles tinham uma página dedicada só a vinhos de Bordeaux de 1982. 1982 está para os vinhos de Bordeaux assim como 1968 está para o LSD. Vocês não iam acreditar no que tem ali.
“Olha que interessante, uma página só para a safra 1982!”, provoquei o sommelier.
“Sim senhor, nós temos muito orgulho dessa coleção.”
E ali quase no fim da lista estava o vinho mais exclusivo daquela seleção de uma safra exclusivíssima. Um Château Petrus de US$ 14,000 a garrafa.
E você acha: isso está aí de decoração, ninguém pede um vinho desses, mas pensando melhor, é claro que tem gente que pede.
Aqueles príncipes sauditas.
Os atores de Hollywood.
Os milionários do Vale do Silício.
Os banqueiros de Wall Street.
Os magnatas de Nova York.
E, claro, o Sérgio Cabral.