Há quatro anos dou aula para uma aluna no curso de jornalismo da Univap que, frequentemente, me ajuda a guardar o equipamento depois das aulas. Essa ajuda não é obrigatória, não é frequente, não é solicitada, mas ela sempre acontece nos dias que mais preciso.
Geralmente, depois de uma aula que durou mais que o previsto ou em dias em que os alunos têm enxurradas de dúvidas e perguntas e me “prendem” no pós aula com uma série de questões, a ajuda é pontual e, frequentemente, eu só me dou conta que ela aconteceu quando vou fechar o equipamento e percebo que ele já está guardado.
Na última aula, em um dia bem corrido, eu saí apressada desta turma e ia me dirigindo para a próxima aula. Ainda com uma leve esperança de ter cinco minutos para comer um lanche, no intervalo das aulas, eis que ouço a voz dela me chamando:.
“professora, não esquece seu equipamento”
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Olhei e lá vinha ela com a bolsa pronta, fios já guardados e arrumados. Dei um longo abraço nela, agradeci e parti para a minha segunda jornada. Graças a este ato de generosidade e empatia da minha aluna consegui comer meu lanche antes de começar minha segunda jornada. E lembro de pensar sobre ela demoradamente naquela noite.
Lembrei de um dia, quando ela estava no primeiro ano do curso e eu ainda ensinava os pontos básicos do texto jornalístico, de ela me parar entre uma rampa e outra dos corredores da universidade e pedir indicações de leitura. “Uma lista com aqueles livros que todo estudante de jornalismo deve ler”. Fiz a lista e tenho notícias que ela segue firme na leitura ainda que também não tenha escapado do medo que percebo surgir nos rostos jovens que estão prestes a se formar.
Essa foi a grande questão que este episódio me trouxe: será que o mercado de comunicação, com todas as suas contradições, consegue identificar pessoas com a delicadeza desta aluna?
O mercado da área de comunicação que está desesperado por bons profissionais, comprometidos, determinados, engajados com o conhecimento, na hora de fazer uma análise dos currículos, consegue ter uma lupa para identificar habilidades intangíveis como empatia, solidariedade e respeito?
Infelizmente não acredito que essas qualidades se destacam no currículo, não é tão fácil escrever sobre o impalpável e, no momento da entrevista, muitas coisas podem influenciar o bom desempenho dos candidatos. Eu, como professora, sempre que for consultada sobre candidatos para cargos na área, não terei dúvidas em indicar primeiro os bons, ou seja, meninas e meninos que escolhem fazer o bem e dedicar coração à sua formação. São esses que indico e são esses que gostaria de poder contratar. Espero que o mercado também!