Os processos de subjetivação de sujeitos com práticas homoeróticas são historicamente abarcados por processos de estigmatização. E essa historicidade possibilita que, por meio da estigmatização, os sujeitos sejam inseridos de diversas maneiras nos sistemas de socialização, bem como nas estruturas de poder. No entanto, essa situação não significa que o estigma seja uma relação permanente, mas sim um processo social em constante variação, uma vez que a subjetividade, o corpo e o modo como experimentamos as relações afetivo-sexuais são constituídos enquanto campos políticos.
Característica desse processo de socialização estigmatizado, a vergonha, enquanto uma emoção constitutiva de toda a formação identitária e central na construção da sociabilidade, marca as experiências singulares, de individualidade, do vivido e do experienciado desses sujeitos. Mas não se pode perder de vista a perspectiva relacional da vergonha e a dinâmica entre vergonha e política, de modo que, devemos considerar a vergonha enquanto um aspecto constitucional para o entendimento de uma política das diferenças. Além disso, podemos identificar na emoção vergonha uma outra gramática para os conflitos e normais sociais, principalmente na luta por reconhecimento intersubjetivo.
No interior desse campo micropolítico das emoções, o medo da rejeição e da violência nas esferas familiar e pública, traduzido na experiência do armário como dispositivo de regulação da vida social e individual, marca a constituição das subjetividades desses sujeitos. Por isso, a atriz canadense Ellen Page ao declarar sua ‘homossexualidade’ publicamente durante uma conferência sobre os direitos dos homossexuais em Las Vegas, emocionou os outros LGBT presentes no evento. Nas redes sociais, esta sua declaração, foi abraçada por muitos LGBT como um ato de coragem, uma vez que tal ação rompe com os medos imediatos e abre espaço para a construção do diferente.
No entanto, “assumir” projetos e estilos de vida homoeróticos não satisfaz apenas uma ordem de fatores individuais. Uma vez que “assumir” não depende necessariamente da decisão subjetiva do sujeito, mas sim das possibilidades históricas e culturais, de tal modo, a experiência individual de cada sujeito adquire significado particular dentro das regras sociais e culturais.
Essa intrínseca relação entre singularidade e processos sociais, por sua vez, provoca a necessidade de problematizar a margem relativa da “possibilidade de escolha” como desejo individual. Por isso, ressalto que “assumir” envolve aspectos subjetivos e paradigmas culturais existentes. E, quando uso a noção de “escolha”, não pretendo sugerir que a apropriação performática de determinados modelos de identidade seja expressão de essências, mas sim produtos de disposições históricas.
Para findar, veja o vídeo (legendado) com o discurso emocionante de Ellen Page: