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Nelson Rodrigues: uma homenagem ao Mestre com carinho

 

Vida e história assim como ela é

[ Introdução ].

Nelson Falcão Rodrigues nasceu no Recife, em 23 de agosto de 1912, o quinto filho de uma família de catorze. Quando tinha três anos, seu pai, Mário Rodrigues, foi tentar a sorte no Rio de Janeiro, capital da República. O combinado era que tão logo encontrasse trabalho, chamava a família para ir a seu encontro. Maria Esther, sua esposa, não agüentou esperar. Em 1916, empenhou as jóias e mandou um telegrama para o marido, já avisando do embarque naquele mesmo dia. Nelson conta, nas “Memórias” publicadas no “Correio da Manhã”, que se não fosse a atitude da mãe, o pai jamais teria permanecido no Rio.

Olegário Mariano hospedou Mário, Maria Esther e os seis filhos (Joffre Rodrigues tinha nascido em 1915) em sua casa por alguns dias. O primeiro endereço da Família Rodrigues no Rio de Janeiro foi a Rua Alegre, na Aldeia Campista. Durante esse período, Nelson começou a desenvolver sua apurada observação sobre o mundo e entrou em contato com o universo passional que seria tema, no futuro, de “A vida como ela é…”. Como a lembrança do rapaz que tomou veneno, em 1917, por ter brigado com sua namorada e da imagem da mãe e da namorada do morto disputando o defunto em pleno velório.

No Rio, seu pai fundou o jornal “A Manhã”, onde Nelson começou sua carreira jornalística, aos 13 anos de idade. Em 1929, tendo perdido “A Manhã” para seu sócio, Mário Rodrigues lança “Crítica”. O jornal que será palco da primeira grande tragédia que irá acometer a família: o assassinato de Roberto.

[ Sobre o assassinato de Roberto ].

 O fato ocorreu por conta de uma reportagem acusatória. “Crítica” ia publicar “as causas ocultas” do divórcio de uma mulher da sociedade. O motivo não alegado publicamente seria o adultério. Quando soube que a matéria sairia no jornal, Sylvia Seraphim foi até a redação para tomar satisfações. Roberto Rodrigues que sempre tivera inclinação para a pintura, também trabalhava no jornal. Enquanto Milton, Mário Filho, Nelson e Joffre apuravam as notícias, Roberto cuidava das ilustrações.

A moça entrou na redação do jornal, no dia 26 de dezembro, e perguntou:

– O Mário Rodrigues está?

– Não. — responderam — É só com ele ou pode ser com o filho?

Nelson estava na redação na hora do crime. Roberto recebeu a moça e fechou a porta da sala. Foi o tempo para ela sacar o revólver de dentro da bolsa e atirar. Roberto ficou três dias entre a vida e a morte. Durante esse tempo, a família acreditou na recuperação.

O assassinato de Roberto marcou profundamente a trajetória da família. Mário Rodrigues, inconformado por seu filho ter sido morto em seu lugar, passou a exagerar na bebida e, em pouco mais de dois meses, morreu.

Milton e Mário Filho assumiram o jornal. Passados poucos meses, “Critíca” foi fechada pela polícia, por ordens do governo, com a vitória de Getúlio Vargas, na Revolução de 30. Começou, assim, o período da fome. Até 1935, quando a situação começou a melhorar, os Rodrigues experimentaram a miséria. Em trecho das “Memórias”, Nelson escreve: “eu e toda minha família conhecemos uma miséria que só tem equivalente nos retirantes de Portinari”.

O saldo do período foram as duas tuberculoses de Nelson, que chegou a ser internado, e a morte de Joffre, aos 21 anos, também devido à tuberculose. Joffre era o irmão mais próximo de Nelson, ele dizia que era como se os dois fossem gêmeos.

Em 1936, ano da morte de Joffre, Mário Filho havia tornado-se sócio do “Jornal dos Sports” e Nelson passou a fazer contribuições sobre futebol. Daí para frente, vai contribuir e trabalhar em diversos veículos, como “Correio da Manhã”, “O Jornal”, “Última Hora”, “Manchete Esportiva” e “Jornal do Brasil”, entre outros. Escreverá crônicas, contos, correio sentimental, folhetins, comentário esportivo e artigos opinativos.

O teatro surge em 1941, quando estréia “A Mulher Sem Pecado”. A grande aclamação de Nelson, contudo, será com a encenação de “Vestido de Noiva”, dirigida por Ziembinski, marco do teatro brasileiro moderno. Nunca se vira nada semelhante no país, público e crítica foram unânimes perante o ineditismo do espetáculo. Apesar das polêmicas sobre obras posteriores e problemas enfrentados com a censura, o valor dramático de Nelson foi reconhecido de imediato por grande parte dos diretores, atores e críticos da época.

Com uma capacidade de trabalho invejável, Nelson ainda fez história na televisão brasileira. Participou de mesas-redondas, com comentaristas como Luis Mendes e João Saldanha; fez “A Cabra Vadia”, no qual pessoas de destaque eram entrevistadas por Nelson com a presença, no estúdio, de uma cabra viva; foi pioneiro na teledramaturgia brasileira, ao escrever, para a TV Rio, a novela “A Morta Sem Espelho”.

Enquanto esteve vivo, acompanhou a adaptação de sua obra para o cinema e chegou a colaborar com o roteiro de “A Dama do Lotação”, de Neville D’Almeida, “Bonitinha, mas ordinária” e “Álbum de Família”, de Braz Chediak. Escreveu, também, os diálogos para dois filmes: “Somos Dois”, de Milton Rodrigues, e “Como ganhar na loteria sem perder a esportiva”, de J. B. Tanko.

Stella Rodrigues e Maria Clara Rodrigues contam que, no final da vida, Nelson estava bastante debilitado e sofria muito. Depois de um aneurisma na aorta, foi operado três vezes. Seu estado era agravado pelo fato de nunca ter tido uma saúde invejável. Nelson Rodrigues morreu no dia 21 de dezembro de 1980. Foi enterrado com a bandeira do Fluminense. Deixou seis filhos: Jofre, Nelson, Maria Lucia, Paulo César, Sonia e Daniela.

[ Cronologia ]

1912 — Nasce no Recife Nelson Falcão Rodrigues, em 23 de agosto, quinto filho de Mário Rodrigues e Maria Esther.

1916 — A família muda-se para o Rio de Janeiro.

1927 — Nelson começa a trabalhar como repórter policial em A Manhã.

1929 — Roberto Rodrigues, irmão de Nelson, é assassinado na redação de Crítica.

1930 — Morre Mário Rodrigues. Junto com os irmãos Mário Filho e Joffre, Nelson começa a trabalhar em O Globo.

1934 — Nelson sofre a primeira de muitas crises de tuberculose. Passa 14 meses em Campos do Jordão para se recuperar.

1937 — Morre Joffre Rodrigues, irmão de Nelson.

1940 — É celebrado o casamento de Nelson e Elza.

1942 — Estreia A mulher sem pecado.

1943 — Zbigniew Ziembinski encena Vestido de noiva.

1944 — Publica em O Jornal, com o pseudônimo Suzana Flag, Meu destino é pecar, em capítulos.

1946 — A peça Álbum de família é censurada.

1948 — Conhece o jornalista e escritor Otto Lara Resende.

1950 — Trabalha como dialogista no roteiro de Somos dois, filme de seu irmão Milton Rodrigues.

1951 — Começa a publicar “A vida como ela é…” em Última Hora.

1953 — Conhece o psicanalista e escritor Hélio Pellegrino.

1960 — Estreia Boca de ouro.

1961 — É publicada, em dois volumes, a seleção dos cem melhores contos de “A vida como ela é…”.

1963 — Nasce Daniela Rodrigues, a “menina sem estrela”, filha de Nelson e Lúcia Cruz Lima. Escreve a novela A morta sem espelho, dirigida por Sérgio Britto, para a TV Rio.

1965 — Estreia Toda nudez será castigada. A falecida é adaptado para o cinema por Leon Hirszman.

1966 — É lançado o romance O casamento, cuja circulação logo é proibida pela censura.

1967 — Inicia as crônicas das “Memórias” no Correio da Manhã. Na redação do jornal, conhece o jornalista, crítico de cinema e poeta José Lino Grünewald. Continua suas crônicas memorialísticas em O Globo, na coluna “Confissões”. Liberação de O casamento. Tragédia: A família de Paulo Rodrigues, irmão de Nelson, morre no desabamento de um prédio em Laranjeiras.

1968 — Reunião de suas “Confissões” no livro O óbvio ululante.

1972 — Nelson Rodrigues Filho é preso por seu envolvimento com a oposição armada ao governo militar.

1973 — Arnaldo Jabor adapta Toda nudez será castigada para o cinema. É encenada a peça Anti-Nelson Rodrigues. Morre Maria Esther.

1974 — É publicada Elas gostam de apanhar, segunda seleção de Nelson Rodrigues para os contos de “A vida como ela é…”.

1978 — Estreia sua última peça, A serpente.

1980 — Morre em 21 de dezembro.

1981 — Sábato Magaldi reúne e organiza em quatro volumes o teatro completo de Nelson Rodrigues.

2012 — Comemoração do centenário do autor.


Fonte: Edmundo Paschoal

Jornalista & Cronista. Apaixonado pela arte da comunicação, crítico e analítico por natureza.

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